domingo, 22 de janeiro de 2012

Eu sonhava.

Eu sonhava.
Eu fechava os olhos e sonhava, sem que você percebesse.
Sem que você percebesse, eu abria os olhos e sonhava o mesmo sonho.
Eu sonhava o mesmo sonho noite após noite, antes de dormir.
Antes de dormir você me beijava, e me prendia no seu abraço.
Você me prendia no seu abraço e então eu era livre para voar.
Eu era livre para voar, então eu fechava os olhos e pulava.
Eu pulava no abismo do sonho e não caía, eu voava.
Eu voava de olhos abertos, e sonhava.
Eu sonhava o mesmo sonho, no qual você me beijava e me prendia no seu abraço,
sem nunca mais me soltar.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Calo por amor.

Calou-se. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que se diz quando se fala de amor.

Tem frases que escrevo e que me perseguem. É sério: eu as escrevo, penso que me livrei, e, de repente, a frase ressurge como se fosse a primeira vez que... o que? Que a escrevi, que a ouvi, que a pensei? Não sei. Frases assim são como pedaços de real que passam por mim, me cortam, mas que não são minhas. Elas me atravessam e deixam essa marca que não cicatriza nunca, que sangra a cada vez que penso, que ouço, que escrevo.

Calou-se. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que se diz quando se fala de amor.

Como assim calar por não poder falar tudo? É justamente por não conseguir falar tudo que eu falo. Falo, penso, escrevo, defino, grito, tudo tentando dizer o máximo que eu puder. Amor? Aí mesmo é que eu não me calo. Praticamente tudo que eu falo tem a ver com amor. Escrevo amor amor amor amor milhares de vezes tentando alcançar, entender, descobrir, saber o que é esse tal de amor que tanto me perturba.

Calou-se. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que se diz quando se fala de amor.

Curiosamente lembrei agora de um dos primeiros posts do meu blog em que eu reclamava me calar por não saber falar de amor. E respondi à minha reclamação dizendo que o problema é que eu só falava do que sabia e organizava, e que era impossível organizar o amor. Parece-me que, daí em diante, resolvi que ia falar sobre amor até aprender. Então escrevi o amor em prosa e poesia, realidade e fantasia, felicidade e agonia, e ainda assim não entendi. Não entendo, não aprendo, continuo não sabendo.

Calou-se. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que se diz quando se fala de amor.

E então, agora, esse calar. Que depois de tantas repetições (na minha cabeça e na tela do computador) me atinge de outra forma. É um calar diferente do calar por não saber ou do calar por conformismo de que não entenderei jamais o amor. Calei, no dia em que escrevi essa frase pela primeira vez, por me submeter ao fato de que não poderia explicar, e nem dizer tudo sobre o amor. Que mesmo tendo muito a dizer, mesmo tendo todas as palavras existentes e inventadas à minha disposição, ainda assim sobraria a falta. A falta, que é o que faz do amor, amor.

Calo-me agora. Não por ficar sem palavras ou não haver mais nada a dizer, mas porque não há como falar tudo que digo quando amo. E é por isso que amo.


*Texto originalmente publicado aqui.


sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Inteligencia e/ou amor

E então eu tenho quatro textos rascunhados há mais de dois meses sem conseguir terminá-los. Volta e meia retorno a eles, apago a metade, escrevo mais um tanto e de repente empaco. O que eles têm em comum além do fato de que eu não consigo colocar-lhes um ponto final? São todos textos "inteligentes". Textos sobre cultura, psicanálise, crônicas sobre o social. E aí hoje li um texto da Inês Pedrosa falando sobre a crença no amor, o segundo que li essa semana abordando o tema, e pensei: que saudade de escrever sobre o amor. Eu sou dessas pessoas que, como a Inês, acredita no amor como outros acreditam em deuses e santos. Eu adoro estar amando, não tenho problemas em me apaixonar e não me retraio por medo de sofrer. Mas, ao contrário do que possa parecer, isso não é uma coisa bonita e altruísta, nem mesmo corajosa. É apenas como as coisas são. Porém, como boa neurótica, eu não gosto de aceitar as coisas como elas são. Então, dentro do meu sintoma, crio uma dicotomia: ou sou inteligente, ou amo. E passo a vida, e perco a vida, buscando equilibrar duas coisas que só são opostas por invenção minha. A verdade é que eu realmente adoro falar de amor, ler sobre o amor, pensar, não entender, me irritar, ficar feliz, tudo ao mesmo tempo e sem ordem alguma. E também adoro ler textos de Lacan dos quais entendo pouquíssimo, passar horas conversando sobre as feridas narcísicas da humanidade ou explicando porque acho que o saber é hoje o deus mais cultuado no mundo. Só que, por algum motivo, é difícil pra mim aceitar que não são duas coisas, ou que até são, mas ambas estão misturadas em mim. E que o que escrevo vai surgir de acordo com o que acontecer na minha vida, e não porque eu decidi que já escrevi muita coisa romântica e está na hora de ser mais intelectual. Até acredito que para outras pessoas funcione assim, mas comigo não. Outra coisa que preciso aceitar: minha escrita, pelo menos aquela que me parece afetar os outros, não é racional. Meus textos "bons" são escritos no ímpeto, com algum trabalho depois, claro, mas o corpo tem que vir todo junto, de uma vez, senão nem adianta continuar. Por isso esse texto. Porque hoje, enquanto eu tentava relaxar para terminar algum dos outros, eu li sobre o amor, e o amor mais uma vez se escreveu, e tive a sensação que precisava escrever isso, preciso parar de lutar contra um pedaço de mim, para que todos os meus pedaços possam existir. Ao tentar eliminar um, elimino a mim, que sou todos esses pedaços desconexos, disformes e desencaixados que, na melhor das hipóteses, se deslocam e me fazem não parar.